sábado, 23 de agosto de 2008

Texto integral

logo, aqui, o texto integral da peça, com marcações em som e luz. dedicado à análise do grupo DRAMATURGOS BRASILEIROS SÉCULO XX1, de Paulo Ricardo Berton

quinta-feira, 29 de maio de 2008

Outra impressão

Outra impressão indelével se deu enquanto eu permanecia atrás do Brunno, no primeiro ato, praticamente escondido por detrás de toda a luz que o engolfava e preparando-me para o segundo ato.
Bom, daquele ponto do palco é possível ver tudo. O Brunno por trás, o Rycardo à minha esquerda, e especialmente todos os espectadores de frente. De frente! (ALGO QUE TANTO MEDO ME DÁ TODOS OS DIAS)
E de frente posso ver como todos recebem o texto do Brunno, ou seja, meu texto. E vejo como a Débora Aoni chora, e como as pessoas se deixam afetar por aquilo que o Brunno fala, por mim mesmo. E eles o fazem na minha frente, como se eu estivesse vendo um fenômeno natural transcorrer livre à minha frente.
Faço a primeira apresentação do segundo ato e posto-me atrás do Brunno novamente. E percebo como não sou notado. Como posso fazer qualquer coisa, praticamente. Como estou à frente de todos, e faço o meu show, e não sou praticamente notado. E como permaneço livre nessa posição, livre para fazer qualquer coisa. Qualquer coisa. E como isso não me afeta. E como meu eu de Rodrigo permanece distante desse imbricamento. Estou completamente nu no palco, mas não sou mais eu. Isso é realmente uma sensação inexplicável de liberdade. Essa, que o teatro, e até agora só o teatro, dá, e realmente dá, não exigindo praticamente nada em troca. Questiono-me se quando eu me tornar profissional essa sensação continuará em mim. Acho que não. Mas não posso apostar nisso.

meu querido Diego Torraca

Contrera,
Gostei muito do texto.
Um depoimento forte, urgente e verdadeiro.
Tenho algumas questões em relação à direção.
No primeiro ato, a influência do Gerald é muita clara: o personagem/autor/diretor sendo questionado por uma desconfiada e provocativa voz off, que me parece, a projeção da consciência desse mesmo personagem/autor/diretor. Até aí tudo bem. É simplesmente uma influência, o que é normal. Por isso, gostei muito do espelho, que serve como metáfora pra essa sabatina do artista com ele mesmo, não fosse o reflexo do técnico de som que comprometeu todo o foco da cena. Mas o que mais me pegou, nesse caso, foi a sua presença na cena. Já era claro que quem falava, através do ator, era o Contrera, o artista. Não precisava sublinhar esse código, que para mim, já estava claro.
No segundo ato, se não me engano, enquanto você falava o seu texto, que revelava a angústia da fuga, eu me questionei se você precisava deixar o palco. Será que não é sublinhar, novamente, o que já está sendo dito?Será que não foi a solução mais fácil? Outra questão de direção.
Bom, trocando em miúdos, o texto me toca muito. Não tenho muito o que dizer, só que gostei muito.
A direção é que me levantou mais questões.
O mais importante de tudo é a honestidade e a inquietação que você coloca em cena.Isso é o que interessa. Parabéns.
Todas essas observações são a partir do meu entendimento da peça. De repente não é onde você quis chegar.
Diga o que você acha disso tudo.
Abraços,
Diego

Diego, querido
Nâo quero simplesmente responder a esse teu email tão verdadeiro e bonito, passo por passo, como se fosse um dever de casa.
Simplesmente fiquei realmente emocionado em ver como todos se deixaram tocar, assim, com tanta delicadeza, e responderam à altura, com simplicidade. Ninguém mentiu para mim, sabe, vindo com tapinhas nas costas sem graça. Quem cumprimentou entendeu isso que vc disse: honestidade e inquietação, e passou a mesma energia para mim. Hoje todos vemos tudo tão de fora que às vezes até os aplausos me enojam. Os de hoje, não. Sei lá, foram tão simpáticos, ao menos para mim.
Como disse a vc pessoalmente, a influência do Gerald eu não consigo aquilatar. Simplesmente as outras abordagens a mim não convencem, e precisei fazer dessa forma. O primeiro ato, o do Brunno, foi feito em outubro passado, e tinha como interlocutor o próprio Gerald - eu tirei, pois não fazia mais sentido. Virou algo ensimesmado. No caso, eu também não concordo muito com essa questão de consciência ou de falta de consciência (que precisa da consciência para aparecer). Simplesmente o personagem questiona sem parar a si mesmo - e sem saber muito bem por quê. A voz é a prova desse questionamento.
Sabe que o espelho surgiu sem querer? Ele já estava lá, e percebemos o jogo no decorrer do terceiro ensaio - foram quatro. Preferimos manter assim, e acabou por consistir quase num outro personagem. O reflexo do técnico infelizmente poderia ter sido minimizado por mim, que ia levar uma LED, mas acabei me confundindo. Pena. Agora, sabe que no fundo o reflexo do técnico a mim não incomoda tanto? Não me pergunte por quê!
Não me recordo bem por que decidi colocar-me em cena. Mas há algo de homenagem à Sônia, do Viga, que faz esse cara-a-cara, para mim tão importante, e por outro lado algo meu, pois PRECISO me colocar na berlinda, sendo ao mesmo tempo um aspecto dominador e por outro lado uma clara posição de ser questionado. Creia, eu não entendo o palco realmente como palco, para mim simplesmente é um ambiente em que os outros sentem-se à vontade para invadir com o olhar. E isso não necessariamente me incomoda - ao contrário. O Brunno sou eu, claro. Mas de meu ponto de vista no palco posso avaliá-lo, avaliar um a um os espectadores, e ter real domínio da cena - físico, inclusive. Creia-me, desse ponto de vista posso e cogito algumas vezes em interferir. Rompendo assim com tudo o que está sendo dado de antemão. Pode parecer desrespeitoso, mas é uma opção, às vezes. Por outro lado não creio criar extrema insegurança no ator, como faz o próprio Gerald. No fundo, eu evito me meter demais. Pois meu interesse é realmente AFETAR o ator, torná-lo algo como parte de mim. Que sinta como eu sinto. Não sempre, mas que tenha esse recurso. E consiga extrair isso de meu texto. Não é fácil, claro (agora escrevo peça sobre mulheres, vamos ver como vai ser resolvido).
Concordo que a fuga acaba sublinhando - talvez demais - algo que está sendo dito. Minha intenção com isso é reforçar ainda mais o texto, e sua dramaticidade. Como eu, contrera, fico cara a cara com todos, e afasto-me aos poucos, creio criar nos espectadores a sensação de que ELES TAMBÉM SE AFASTAM. Ou seja, que não sou eu apenas quem foge, mas que eles, por não se manifestarem, deixam que eu fuja. Atribuindo a eles algo da dramaticidade do texto. Com a música, creio conseguir algo disso.
Os textos, querido, são eu. O primeiro é uma preocupação política real com uma convicção também real - que todos estamos sempre imbricados com outros de nós. O segundo é a resposta a um questionamento do Gerald e que hoje virou divisa sempre que me pego deixando de defrontar aquilo que tanto me preocupo em entender. O terceiro é uma convicção profunda de que vive-se para amar.
Bom, é minha primeira direção, e sempre sinto que pode haver tanto a acrescentar. Mas o que me importa sempre, no fundo, é a reação do espectador EM SUA INTIMIDADE (a reação externa não me causa nada). Se o espectador reclama de que não há nada no espetáculo que ele queira consumir, isso me irrita. Mas se ele se deixa levar e sai e entra acabrunhado por sentir que entendeu menos do que deveria, isso me anima. Vc não imagina como me animou existirem tantos na platéia que decidiram ficar para o segundo round. Deu para perceber que eles queriam não simplesmente mais, mas melhor. Entender melhor o que eles já haviam digerido, parcamente.
Bom, vc sabe, o espetáculo foi gravado, em duas posições. E ele será disponibilizado no youtube. Para quê? Para que quem quiser possa tentar entender POR DENTRO o que a minipeça quer dizer, algo muito íntimo mas nada biográfico. Algo que diz respeito a todos nós e que muitas vezes assume o nome de anomia, alienação, mascaramento de sensibilidade, ausência de memória, ou simplesmente nossa tendência a mentirmos para nós mesmos. Claro que nunca sou nem jamais serei o único a tocar nesses pontos, mas isso faço do meu jeito, e esse jeito tem a ver com esse tom de voz e de técnica que perpassou estas apresentações. Passei a vida toda encontrando coisas para consertar fora de mim, e de repente me vi diante da situação de que nada conseguiria eu mudar se eu não me prontificasse a questionar tudo em meu interior. É isso que a peça se propõe a jogar à tona, ao espectador.
Bom, vc sabe, adorei teus comentários. Me ajudam sempre muito. E isto que escrevo é apenas o começo. Logo escreverei mais no blog de Somente uma pequena mostra de amor.
flw, meu caro, vc realmente ajuda muito, sabe?
sinta-se à vontade sempre que passar por aqui.
abração!
Rodrigo Contrera

terça-feira, 27 de maio de 2008

Sobre a peça "Somente uma pequena prova de amor" (Rodrigo Contrera)

A peça, com duração máxima de 30 minutos, compõe-se de três atos-solilóquios e um encerramento.
O ato 1 consiste num diálogo entre um homem e uma voz (1). O homem não tem nome e a voz surge de algum lugar indefinido. Na peça, o texto fala por si. (Veja a íntegra) Fiz o texto com base em sensações que me incomodavam e que ainda me incomodam. O texto não é autobiográfico porque não uso a mim mesmo como centro da trama. No centro, há sempre a história. O narrador é objeto da história e coloca-se como tal, mas tenta ser sujeito e não consegue. Na versão inicial, havia muito melodrama girando ao redor do homem. Convenceram-me e convenci-me de que isso não deveria existir. Na versão inicial, o homem tinha nome: era eu. E tudo o que era narrado era verdade. Na versão da peça "Somente", o homem não tem mais nome, mas tudo continua sendo verdade. O texto foi lapidado e retirados palavrões ou menções chulas. Na encenação, o homem fica no centro do palco, numa cadeira, em posição sentada, sem se mexer praticamente. Não expressa corporalmente nada. No tom de voz, o homem deve ser neutro. Não pode passar impressão de sentimentalismo consigo ou com os outros. O homem apenas narra. A única coisa que muda é a altura da voz e as pausas. A expressão é neutra, o máximo possível. Brunno, que atuou nesse papel em "Somente", desempenhou o homem forçando-se a não falar alto, a não expressar sentimentos, a não atropelar a música. A música (Fratres, de Arvo Pärt) foi escolhida durante o processo de encenação, e tornou-se fundamental por - por acaso - combinar exatamente com os momentos-chave da fala do homem. Não consigo mais imaginar o ato sem essa música em particular, pela Bournemouth Orchestra (Inglaterra) (7243 5 75805 2 6). A luz explode no rosto do homem em momentos particulares (às vezes, antes de uma pergunta da voz, outras vezes quando o homem fala) e desaparece totalmente em um momento especial (quando o homem pergunta à platéia se esta já ouviu o som de uma bomba real). Ao final, a luz desaparece aos poucos, sempre focada no homem. Atrás do homem, há um espelho - que foi preferido ao pano preto. O espelho já existia no palco do ECAL e seu potencial dramático foi avaliado depois, ao acaso.
O ato 2 consiste num monólogo-solilóquio. O texto, de nome Fugindo (2), foi falado por mim, em voz propositalmente baixa. Eu estava colocado atrás do Brunno, durante o Ato 1, e saí desse lugar com a segunda música (também de Arvo Pärt, em homenagem a Benjamin Britten). O movimento do narrador consistiu em sair de trás do homem, postar-se ao seu lado, avançar, sentar-se na separação entre platéia e palco, enquanto falava, encarar os espectadores com uma luz muito fraca, avançar para trás da platéia e sumir na escuridão, após o final do texto. Desde "Onde você estava? (Fugindo)" e mesmo antes, eu pretendia falar o texto dessa forma. Tentamos que o Mauryas o falasse, mas ele - com justificativa da falta de tempo - não quis. Ficou para mim. Numa encenação quase final, o narrador voltava ao palco, mas no último dia preferi fazer o narrador realmente desaparecer (até para melhor orientar o Rafael, do som e luz, durante o espetáculo). A luz, nesse ato, foca o canto inferior direito do palco, longe do homem e do homem jogado ao fundo (ato 3). A luz não é muito forte. Com o passar da fala, a luz some. A música continua até o fim, realmente, com maior ênfase nos tons médios e graves.
O ato 3 consiste num solilóquio de um homem jogado ao fundo do palco. Esse texto, originalmente chamado "Eis-me", foi feito para publicação no blog http://www.oracoesaovento.blogspot.com/. É uma narração do que se passava no meu interior naquele momento. O texto narra o convencimento de um homem de que é chegada para ele a hora de amar ou morrer. O texto, falado por Rycardo Moreno, foi utilizado para ser dito com voz neutra, calma e pausada. Nesse ato, foi usada a música Spiegel im Spiegel, também de Arvo Pärt. A luz foi colocada no mesmo canto da luz no ato 2, mas mais forte. O homem, que não se mexe, fala para baixo, praticamente sem entonação. O homem fala, a música acompanha. Quando o homem termina, a música continua um bom tempo. A luz não se mexe.
O ato 4 toma como base a Introdução da Glagolitic Mass, de Leos Janacek, e simplesmente mostra, com luz ampla, o movimento do homem, que pega a cadeira e coloca-se de costas para a platéia e de frente para o espelho, e do homem jogado, que se vira repentinamente de lado. A luz some rápida, a música continua e a peça acaba. O final foi feito em conjunto com todos.

(1) Esse ato foi feito a pedido de Gerald Thomas, para apresentação num evento ignorado em 15 minutos. Vim no entretempo a saber que a pequena peça deveria ser encenada nas Satyrianas de outubro de 2007. Na primeira versão, o ato consistia num diálogo entre eu (Contrera) e Gerald Thomas (que não influenciou em nada na concepção). O Gerald demorava a me dar resposta, então decidi eu mesmo bancar a exibição nas Satyrianas. O espetáculo chamou-se "Onde você estava? (Fugindo)", Brunno Almeida ficou a cargo da direção e Rafael Fabrício e Renata Becker, das atuações. O Brunno - que na versão inicial estava elencado para o papel, e que deixou a cargo do Rafael - depois iria fazer o papel do homem, sob minha direção. Este espetáculo virou "Somente uma pequena prova de amor" (o nome foi bolado por mim, no improviso, quando combinamos a encenação, por volta de março ou abril de 2008).
(2) O texto foi feito a pedido de Gerald Thomas em 2006 e apresentado numa peça dele pelo autor, duas vezes. A origem do texto é uma pergunta do Gerald a mim: "Do que é que você foge, Contrera?". Naquele dia, o Gerald pediu um texto para mim. Fiz o Fugindo, como resposta. O texto foi feito no Fnac da Paulista em exatos 15 minutos (meu micro estava quebrado e eu não queria deixar de apresentar um texto ao Gerald). O texto é simplesmente minha apresentação ao público e ao mundo, como um homem que foge de si mesmo.

segunda-feira, 26 de maio de 2008

Impressões

Nunca me recuperarei por completo do sábado passado, a tal ponto me marcaram diversos fenômenos ocorridos durante a peça "Somente uma pequena mostra de amor". Alguns desses fenômenos foram desejados por mim; outros, simplesmente aconteceram e afetaram-me fortemente; outros simplesmente me surpreenderam, positiva e negativamente. Foi como deparar-se diante de um corpo morto. A gente não busca isso. A gente simplesmente cai numa situação dessas.

A foto acima é do Weegee. Foi a única que encontrei na internet com os olhos mortos. Tenho um livro - Weegee's world - que mostra várias mais do tipo.

A peça teve quatro partes. Na primeira, o Brunno apresentou-se. Na segunda, eu saí das sombras, li o texto "Fugindo", encarei a platéia bem no nível dela (cara a cara, próximo a muitos deles), e fui até o fundo da platéia, sumindo do campo visual e auditivo deles. A terceira foi a fala do Rycardo, ao fundo do palco. A quarta foi o Brunno e o Rycardo, virando os corpos.
A cena que provavelmente mais me marcou ocorreu quando eu encarava os presentes sentado na divisão entre palco e platéia.
Lembro-me bem. Os espectadores estavam todos me olhando. Com os olhos dos garotos da foto acima. Lembro-me bem. Eu continuava dizendo o texto, sem muita expressão, mas dirigindo-me a eles. Eles apenas me olhavam. Lembro-me bem que a Raíssa Peniche, a atriz, estava bem no centro do lado direito (meu) da primeira fileira. E lembro-me de haver tentado enxergar seus olhos, ver alguma expressão. Nada. Isso era como falar a pessoas mortas. Era como se eu mesmo estivesse morto - pois muito provavelmente eu aparecia a eles da mesma forma. Foi realmente chocante. Pois não me senti mal. Senti-me tão bem como na infância. Como se naquele momento eu os pudesse ter COMIGO. Quero repetir isso ad infinitum, isso eu sei. E não sei como irei fazê-lo. Nem sei se isso é teatro. Mas a mim não importa. Quero isso e pronto.

* * *

Agora há pouco, o Rafa diz para eu não subestimá-lo. Eu respondo que não faço isso, mas que simplesmente quero mudar tudo. Sim, pois o mundo como está não agrada meus desígnios. Para eu me sentir bem, só mudando as referências que sou obrigado a aceitar para conseguir viver com os outros. Criando meu mundo, claro.

Escrevo a ele:"a realidade é que não podemos mudar nada. mas eu quero ainda mudar tudo. típico. mas por favor não ache que com vocês eu uso de pretensão. não é isso. eu simplesmente não aceito as coisas como me aparecem. e preciso criar em algum lugar um simulacro daquilo que eu gostaria que existisse - ou que talvez exista mas eu não consigo entender e aproveitar".

domingo, 25 de maio de 2008

Ótimas surpresas

Foram muitas as ótimas surpresas antes, durante e após as apresentações, ontem.
Foi lindo ver o Leone perdido, com a família. E a mulher e a filha, sem saberem o que fazer.
Foi lindo ver o Hermas mais que perdido, cumprindo algo para si mesmo - e ao fim gostando muito.
Foi lindo ver o Doni chegando sorrateiro dizendo que todos os outros furaram, mas que ele apareceu. Uma graça.
Foi maravilhoso ver a Rose completamente deslocada.
E o Osmar, o maravilhoso China, abafando com um terno do cacete. E a família fazendo jus ao seu papel de família enorme e unida. E as garotas fagueiras sem saber se falavam ou não.
E o Diego e irmão lá, confirmando que realmente há algo de muito honesto e inquieto nisso que faço, fazemos, fazem todos.
E tanta gente bonita. Um senhor negro pequeno, pequenininho. Um garoto mulato alto, alto, e humilde, coitado. E uma moça realmente perdida. E o Ruy Jobim, colega da ECA, que assiste sem conseguir ouvir, quase. E as atrizes de O Claustro, uma delas que se emociona (não vou dedurar).
E o Edu, que filma, tão amoroso, confirmando que não foi só ela que chorou no meio do espetáculo - e que ninguém viu, quem sabe só eu e ele. Não é lindo?
Há quem queira as luzes da ribalta. Algo para compensar, quem sabe. Eu, não. Quero ver e ser visto. Mas não quero ser devassado. Isso, só a quem me ama. Quero amar todos, sim. Mas não ao preço de me perder de mim mesmo.

A peça
O Brunno classificou de Leitura Dramática. Eu chamei de Exposição em 4 atos.
Não importa.
Parto do pressuposto de que nós, pessoas, cada vez mais, o dom da conversa. E que tudo parte de que não ouvimos o outro.
A exposição vem daí. É a exposição por meio da imagem da pessoa em estado natural e do texto que a revela. Não é uma leitura porque não sai para fora. Fica dentro. Ninguém lê nada para ninguém. Ele fala para si e deve mostrar isso, que os outros não existem, realmente, ou que precisam mostrar-lhe algo para existirem. Isso, ele diz em "Não estou só": se eles não se emocionarem, não estão aí.
O homem que foge expõe-se, também. Aproxima-se e vê todos face a face - como eles o vêem. Mas a luz destrói as faces: restam as sombras, as sobras. É a aproximação de alguém que vai embora. E vai. Não volta.
O homem no chão expõe sua situação e o ponto a que chegou. Sabe que agora só viverá se amar. Não explica o que seja isso. É óbvio.

sábado, 24 de maio de 2008

Um passo de cada vez

"Somente uma pequena prova de amor" trata, é claro, de amor. Durante os ensaios, eu parecia convencido de que esse tal amor" era de mim para mim mesmo. Como se ao fazer a peça eu estivesse provando algo para mim mesmo - o amor que sinto por mim e ao qual tão dificilmente consigo dar vazão. Trato-me mal, trato mal quem me ama, mal como, mal me exercito, exijo-me
mais do que o necessário, pareço um animal que vive de levar a si mesmo à exaustão.
Agora há pouco, porém, ao tomar um banho e me aprontar para a estréia (dois espetáculos, seguidos, para realizar a gravação disso que se tornou meu primeiro plano-piloto), reparei, pensando nos últimos meses, e especialmente em ontem, ao discutir com a Cris sem necessidade e - novamente - levá-la ao choro, que eu posso realmente jogar tudo por terra se insistir em me resguardar e não sentir amor pelo público - pessoas de carne e osso, pessoas que eu admiro muitas vezes e que me surpreendem quase sempre - durante a exposição (que é como eu chamo o espetáculo). Pois é isso mesmo. Se há alguma coisa que eu aprendi estes últimos meses é que só mantemos o que temos por amor e só conseguimos algo mais para nossa vida se o fizermos por amor. O resto vai-se embora, realmente, e muitos de nós não reparam o suficiente nisso.
Isto aqui não é, claro, uma lavagem de roupa suja. O que foi, foi; o que vem, vem. Nada que tenha acontecido pode voltar. Nada que vier a acontecer acontecerá diferentemente de como o conduzirmos. As coisas assim são. Eu tenho jogado tudo a perder anos a fio, por medo; e agora estou novamente face a situação de saber conduzir-me sem jogar tudo por terra. Agora percebo que a frieza necessária a que tanto me refiro nos ensaios é simplesmente a cabeça fria de quem sabe que a vida não é necessariamente cruel, mas que consiste em aceitarmos que tudo é apenas resultado de nossos atos, de sabermos amar ou morrer.